Recentemente, o relato do britânico Guy Adams ao jornal Daily Mail chocou o mundo: seu filho Willian estava em tratamento, aos 3 anos de idade, por causa do vício no uso de tablets. À publicação, o pai afirmou que a criança chegou a agredir sua irmã de poucos meses, porque ela chorava durante um jogo, o que o desconcentrava. Segundo o psiquiatra Richard Graham, da clínica Capio Nightingale, localizada em Londres, os sintomas do vício nas crianças podem ser observados quando o aparelho é tirado delas, fazendo-as reagir com birras e comportamento incontrolável. Foi exatamente o que ocorreu com o pequeno Willian que, segundo o pai, ficou apático e sem fome, sinais que foram confirmados pela professora dele. “Quanto mais precocemente disponibilizo esse tipo de tecnologia a uma criança, maior é o comprometimento que vai haver”, afirmou o psicólogo Cristiano Nabuco de Abreu, 51, coordenador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Programa Integrado dos Transtornos do Impulso (PRO-AMITI) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, pioneiro nos estudos do tema no Brasil.
A preocupação, portanto, se concentra nos jovens e nas crianças mais vulneráveis a esse tipo de dependência, principalmente pelo surgimento cada vez mais frequente dos jogos online. Diante dessa situação, o pai citado na abertura dessa matéria não cruzou os braços: buscou ajuda, submeteu o filho a um período longe do aparelho e criou regras para o uso dessa tecnologia. Mas será que essas são atitudes suficientes? Muitos adultos acham engraçadinhas as crianças que, desde muito cedo, já sabem como desbloquear a tela de um celular, por exemplo. Pesquisas revelam que uma em cada três crianças usa recursos tecnológicos antes que seja capaz de falar corretamente. Mas, para o psicólogo, “isso não é motivo de orgulho, pelo contrário, é motivo de preocupação!”. Apesar de ser bastante estimulado o uso da ferramenta entre os pequenos, pois auxiliam no desenvolvimento intelectual, essa utilização tão precoce também traz sérios problemas, inclusive para o desenvolvimento neurológico e fisiológico. “Várias pesquisas já mostraram, por exemplo, que se é dado um texto escrito em papel e o mesmo texto no computador, aqueles indivíduos que leem na tela vão ter um entendimento prejudicado em quase 50% [em comparação aos primeiros]”. COMPARAÇÃO MONSTRUOSA
Os sintomas de abstinência do pequeno Willian foram observados quando, segundo seu pai, ele iniciou um tratamento em que deveria ficar 72 horas sem usar o tablet. Ele lembra que as 24 primeiras horas foram de gritos e descontrole total. Estudos revelam que a reação do cérebro à falta de jogos é similar ao que se nota em casos de dependentes químicos, quando privados do uso de álcool e drogas. Ainda durante a entrevista, o Dr. Cristiano explicou que essa sensação de prazer ocorre “quando a pessoa consegue entrar e fazer a conexão”. Segundo o Dr. Cristiano, “o que é curioso, embora sejam dependências distintas, é que já existem pesquisas que mostram que o que ocorre nos neurônios de indivíduos dependentes de álcool e drogas também ocorre nos indivíduos de internet. O neurônio é envolvido pela bainha de mielina e, quando o indivíduo usa álcool ou droga, há um desgaste dessa membrana. E é também o que acontece com os indivíduos dependentes de internet”.
“Dependendo da intensidade do jogo, mesmo que você esteja num [game] educativo por muito tempo, isso [o uso excessivo] será igualmente prejudicial”, explicou, reforçando: “A ideia é que as pessoas tenham bom senso!”. PROBLEMAS EM CADEIA
Pais e responsáveis costumavam reclamar do tempo que as crianças passavam em frente à televisão. Hoje em dia, a reclamação mudou apenas de plataforma. Além de problemas intelectuais, especialistas relacionam o tempo passado diante de telas com problemas de saúde física, que incluem obesidade; colesterol e pressão altos; sedentarismo; e dificuldades para ler e fazer cálculos. Além disso, também decorrem desse transtorno distúrbios do sono e isolamento social.
Os aparelhos são tão eficazes em ocupar as crianças pequenas, que muitos pais já usam como uma espécie de babá. “Os pais preferem que eles estejam conectados a estar nas ruas”, constatou o psicólogo.